06/12/2010

Como vim ao mundo

A vida era no mato.
Entre plantações de chá a perder de vista, Acácias com flores de todas as cores, mangueiras, goiabeiras, bananeiras, árvores da borracha e um infindável e robusto arvoredo. No Tacuane! O clima era de guerra, ou pelo menos de prevenção para a guerra. Não é que eu alguma vez tenha visto guerra, porque nunca a vi, mas fui preparada e ensinada desde pequena a defender-me e/ou fugir. Fui uma felizarda, porque nunca precisei. :) Os homens, como sempre incumbidos de proteger as mulheres e as crianças, combinavam e definiam estratégias de defesa e dissimulação. As mulheres seguiam as suas vidas e fingiam que nada se passava. As crianças mais pequenas brincavam inconscientes do perigo, as mais crescidas iam sendo alertadas e treinadas em técnicas de escape e defesa. A vida era boa, tão boa quanto alguém podia desejar nos anos 60. Certo dia aconteceu…, foi assassinado um homem! Encontrado morto na casa que lhe havia sido atribuída na véspera. Nem chegou a iniciar o trabalho no seu novo emprego, na Madal. Soou o alerta… Mulheres e crianças evacuadas de avião e postas em segurança na cidade mais próxima, Quelimane. No lar da Madal. Homens reunidos, à noite, em casas seguras, quais fortes de guerra! Ficou para trás uma mulher, que, por esperar um filho para o mês seguinte e não conhecer ninguém em Quelimane, foi transportada de carro por picadas, aos saltos, tão depressa quanto o marido conseguia, ao longo de 110Km, até à vila mais próxima, Mocuba. Aí sim, conhecia pessoas que a acolheriam como uma filha! Mas, o resultado, o filho que esperava para o mês seguinte, nasceu no dia seguinte, 21-01-1965! E não era filho, era filha! Eu! :)))


Assim nasci com cerca de duas semanas de avanço relativamente ao previsto. Terá sido do susto que a minha mãe apanhou? Terá sido da viajem atribulada, aos saltos por picadas? Teria eu pressa de nascer? (É bem possível!... Ainda agora "tenho bichos carpinteiros" e não sou capaz de estar quieta) Ou teria sido apenas o tempo mal contado? Não sei e também não interessa, porque correu tudo bem! Eu nasci bem e saudável! A minha mãe teve um parto doloroso, como são (em geral) todos os partos ao natural, ainda mais sendo da primeira gravidez. A minha madrinha Augusta Oliveira tratou a minha mãe como uma filha e o meu padrinho teve o trabalho de a transportar várias vezes à Maternidade de Mocuba e de volta para casa, por ainda ser cedo. Acabei por nascer pelas 17:05H, depois de um dia de viagens à Maternidade de Mocuba.


Sempre ouvi a minha mãe contar que nesse mesmo dia nasceu também na maternidade um filho do Sr. Gouveia. Mas nunca conheci esse menino, agora homem. Também sempre ouvi a minha mãe contar que o meu pai foi de imediato chamado pela rádio, para o Tacuane, para ir novamente a Mocuba porque já lá tinha uma menina à espera :) Contam que depois dessa viagem o meu pai comentou que nunca antes tinha batido tantas vezes com a cabeça no tecto do carro! Guiar por picadas a alta velocidade dá uns valentes abanões!!! :)))



1 comentário:

Isabel Teixeira disse...

Olá maninha :-)
Nessa altura ainda eu andava sabe Deus aonde!
Felizmente, a Paz manteve-se o tempo suficiente para que os nossos pais lá estivessem mais 11 anos em Moçambique e eu tivesse o privilégio de também lá nascer e viver o tempo suficiente para ainda me lembrar de muita coisa.
Obrigada pela partilha!
Beijos
Belita