05/01/2011

Água de Lisboa

Decorria o mês de Maio de 1969. O frio já se fazia anunciar. Sinal disso era as mamanas com as cabeças cobertas, com as capulanas coloridas. Eu tinha pisado terras de África havia seis meses. Morava numa terra a que uns chamavam vila de João belo outros Xai Xai.

 

Pela tarde, devia ser pois, o meu marido estava em casa, os funcionários públicos tinham horário único, apareceu-me um velhote negro, o qual se sentou na soleira da minha porta da cozinha e disse-me: “senhora dá-me água de Lisboa!” Eu dei uma gargalhada. Eu só tinha vinte e um anos, e com essa idade nós rimos por tudo e por nada, mas esta gargalhada não foi só fruto da juventude, foi pelo absurdo, pensava eu, do pedido dele. E disse:”ouça lá você por acaso não apanhou muito sol na cabeça? Então eu acabei de chegar a África e você quer que volte para a Europa buscar-lhe água?”e pensei: calhando isto é um ritual de praxe, eu era caloira em terras de África. O meu marido ouviu a nossa discussão, no bom sentido claro, e perguntou:”o que se passa?” “ele quer água de Lisboa. Eu acho que ele está doído” “não está nada” respondeu o meu marido, e também se riu, não dele mas de mim, e disse: “o que ele quer é vinho”. Perante aquela resposta fiquei de boca aberta. Também não era para menos.

 

Ora qual foi a ilação que eu tirei daquela história? Foi que os brancos foram dizer aos negros que Lisboa era uma terra abençoada ao ponto de a água que lá havia ser vinho. O vinho sempre conquistou os povos, desde os tempos bíblicos.

 

Rosa Cortez

 

P.S. Escusado será dizer que lhe demos um copo de vinho ou seja,”água de Lisboa” e ele fez uma festa     

 

 

 

   

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